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Os dias contados da profissão de marceneiro na história de uma vida

Profissional reconhecido pelo trabalho vê sua atividade em declínio e conta os motivos para cada momento da trajetória

Esta pauta surgiu diante da necessidade de um jornalista do Olhar67, que precisou dos serviços de um marceneiro para consertar o lastro da cama que havia quebrado.

Ao procurar um profissional pelo bairro Santo Amaro, ele se deparou com a marcenaria do senhor Sebastião, que o atendeu prontamente, mas disse que não poderia fazer o conserto no momento, porque tinha vendido suas ferramentas, pois estava encerrando suas atividades como fabricante de móveis.

O senhor Sebastião estava com a voz embargada, um olhar triste, transparecendo um certo desapontamento, e continuou contando sua história àquele estranho: “…depois de 65 anos de profissão, vou ter que parar. As pessoas não querem mais comprar móveis fabricados sob encomenda, de madeira e com grande durabilidade, elas preferem comprar aqueles vendidos pelas grandes lojas, que duram menos e quando estragam não precisam consertar, é só ir na loja e comprar outro”, desabafou na ocasião.

O jornalista, ao sentir aquela emoção e ver a tristeza no semblante daquele senhor, perguntou se ele poderia conceder uma entrevista para a equipe do site. Sem pensar muito e nem entender direito o convite, o marceneiro abriu um sorriso e aceitou, mas perguntou com um tom desconfiado: “Tenho que pagar alguma coisa?”

Não senhor, responde o jornalista. Então, trocaram contatos, marcaram o dia e o horário, gravamos a entrevista e aqui estamos para mostrar a história do senhor Sebastião. Isso é Olhar além, é sensibilidade, é se importar com o próximo, querer ouvir e contar suas histórias.

Olhar 67 - Os dias contados da profissão de marceneiro na história de uma vida
Seo Sebastião mostra que não perdeu a habilidade com as ferramentas de marcenaria. Foto: Odil Santana

O marceneiro Sebastião Machado Rodrigues, aquidauanense, tem 82 anos. Apesar da idade, ele ainda demonstra firmeza nas mãos para operar as serras. A história dele com a marcenaria profissionalmente começou ainda nos anos de 1960, quando deixou a “Princesa do Sul” para ir trabalhar em São Paulo.  “em 69 eu saí de Aquidauana e fui para São Paulo, trabalhar lá. E lá, trabalhei e em 73 eu vim embora e montei uma pequena firma na rua Maracaju, que era denominada Marcenaria Aquidauanense”.

A habilidade de lidar com a madeira é um talento que seo Sebastião aprendeu a desenvolver ainda bem jovem. Ele conta que ainda criança fazia piões com galhos de goiabeira, carrinhos e outros pequenos objetos de madeira. Ainda adolescente foi trabalhar em uma marcenaria onde aprendeu de fato o ofício. Foi assim que se estabeleceu profissionalmente na vida e começou a própria família. A mudança para São Paulo foi uma oportunidade profissional bem aproveitada, mas que tinha um objetivo bastante diferente e louvável: a educação dos filhos. “A minha senhora foi quem sugeriu vir para os grandes centros, mas eu, na hora não queria. Com muito custo ela me convenceu e fomos para São Paulo. Graças a Deus foi muito boa a ideia dela e conseguimos formar todos os nossos filhos”, revela seo Sebastião.

No entanto, o sucesso profissional dos filhos é hoje um dos motivos para o fechamento da empresa. Eles não quiseram dar continuidade ao ofício do pai. “Eles sabem algumas coisas de marcenaria, mas decidiram seguir por outros caminhos. O mesmo aconteceu com os netos, que também estão encaminhados”, reconhece.

O legado do ofício, se não vai continuar com a família, ficou para os aprendizes que passaram pelas mãos do seo Sebastião. E não são poucos. A prova está nos títulos que recebeu como reconhecimento pelo serviço prestado à sociedade.

Após 65 anos de trabalho contínuo, enfrentando tempestades e planos econômicos, com uma atividade totalmente artesanal, ficou difícil continuar com a oficina. Para não perder o imóvel, único bem durável adquirido em tanto tempo de trabalho, o marceneiro precisou se desfazer do maquinário mais pesado, mas não pretende parar de trabalhar. Não esconde o receio de que, com a aposentadora, venham as doenças por ficar parado. E não esquece que ainda tem dívidas para pagar que não pretende deixar de herança. “Agora só vou pegar coisa pequena que dá para fazer com pouca ferramenta”.

Uma outra dificuldade que o marceneiro aponta é uma circunstância dos tempos atuais que atingem diretamente a matéria prima. As melhores madeiras têm preço muito alto no mercado, o que torna o produto final menos acessível ao público. Isso quando ainda podem ser encontradas, porque muitas espécies hoje têm a comercialização proibida. Ainda sensibilizado pelo final de carreira, seo Sebastião lembra com saudades dos grandes clientes para os quais construiu móveis de alto padrão. Entre políticos, autoridades civis e muita gente importante, o marceneiro gosta de lembrar do arquiteto Pedro Scalise, para quem fez muitas peças requintadas.

A emocionante reportagem, rica em imagens e detalhes inspiradores, você confere no link abaixo, no canal do Olhar67 no youtube.

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